segunda-feira, 3 de abril de 2006

Jorge Luis Borges escreveu certa vez sobre Franz Kafka :

..(o tema de Kafka) "é a insuportável e trágica solidão de quem carece de um lugar, por humilíssimo que seja, na ordem do universo."
("Nosso pobre individualismo" em "Outras Inquisições")

Daí eu me pergunto: que lugar na ordem do universo pode ter Gregor Samsa? Que outra coisa, além de uma insuportável e trágica solidão, pode carregar um inseto monstruoso? Ou qualquer um, que seja diferente, estranho, alheio, inadequado? O que pode haver, nesse mundo mesquinho e perverso, para aqueles que, sem saberem porque, saíram diferentes do padrão? O quê? Além de solidão?

24 comentários:

gio disse...

ih... ela ta aproveitando os livros q ta lendo pra especializacao pra postar textos cabeças... ;)

bRUno

gio disse...

A solidão é o sentimento que mais me assusta. Ainda bem que não nasci tão diferente. =S

Breno | Homepage

gio disse...

Ainda quem está dentro do padrão pode se ferrar e acabar sozinho, vide Joseph K. (O Processo)

Mythus

gio disse...

putaqueopariudezmilvezes!!! Ultimamente eu andava pensado justamente sobre kafka. Reli a metamorfose, li o veredicto, li algumas coisas sobre kafka (inclusive o romance "Os Leopardos de kafka, de Scliar) e mais algumas coisas soltas. Bom, acabei descobrindo em que EXATAMENTE gregor samsa se metamorfoseou! Quando eu li a 1ª vez, pensei em uma barata; até porque seria a coisa mais asquerosa do mundo que causaria tamanho nojo como causou. Mas, na verdade, ele era um inseto da ordem dos coleópteros de nome científico "Ateuchus sacer". Note que o sacer guarda uma íntima ligação com o sobrenome de gregor: samsa, que, por sua vez, tem uma íntima ligação com o sobrenome de franz, kafka: ambos tem 5 letras, uma letra diferente no meio e duas sílabas repetidas. Críticos descobriram q Kafka fazia isso com seus personagens, mas o lance de definir o inseto de "A Metamorfose" é mérito meu. Aliás, kafka exigiu do editor que não tivesse nenhuma definição do inseto na obra.

ailton | Homepage

gio disse...

e eu discordo veementemente de tu sobre a solidão e a procura do espaço social. Não sei o que o argentino falou, mas, pelo contrário, eu acho q o que kafka fez durante toda sua vida foi justamente negar esse espaço social. Por exemplo, ele foi noivo umas cinco vezes na vida e nunca chegou a casar. Analisando a biografia dele, a gente vê q ele não casou porque não quis, ele desistia dos casamentos, ludibriava mesmo as noivas. Ele nunca quis casar, nunca buscou isso como meta de vida. E convenhamos que casamento é um status social. E sobre gregor, pode-se ver a guinada que houve na família dele depois da metamorfose. O pai, q se jugava acabado, começou a trabalhar, a honra foi devolvida para sua família. A irmã tbm teve seu espaço social definido depois da transformação e até depois da morte do inseto. A metamorfose era, na verdade, uma transmutação da vida social da família de gregor - e ele mesmo encontrou seu espaço social: a morte. Perceba q ele morreu sem justificativa, foi como se tivesse escolhido a mort

ailton | Homepage

gio disse...

De certa forma estamos todos sozinhos. Existe uma solidão essencial que é praticamente impossível de transpor. Mas acho que dá para se comunicar e juntar as solidões de vez em quando. Apesar do tom desse comentário, eu não sou tão pessimista :)

Andrei | Homepage

gio disse...

E Ailton, eu não concordo em analisar a obra a partir da biografia do autor. A obra tá lá por ela mesma, acho que isso independe de kafka ter deixado noivas de lado ou não.

Andrei | Homepage

gio disse...

Brunix - e pode não é? :P | Brenim - a solidão é A coisa que me assusta. mas dizem que ela me cai bem ;) | Mythus - tomar consciência disso torna o mundo ainda mais mesquinho e perverso :/ | Ailton - pode ser. porém continuo achando que ele virou um baratão. quanto à relação solidão x lugar na ordem do universo (ou espaço social) eu tou falando de Samsa e não de Kafka. a vida de Kafka não entra nessa discussão (pelo menos não nessa aqui). tudo bem. com a metamorfose e depois com a morte dele a familia tomou um rumo que havia perdido. mas eu insisto que eu falo de Samsa e não da familia dele. além disso morte não é lugar ou espaço ou papel. morte é a curva na estrada como diria tio Fernando Pessoa. morte é o não-lugar e o não-espaço e o não-papel. | Andrei - enfim né? mas solidão essencial é diferente de dessa solidão de quem não tem lugar. concordo contigo ao discordar de ailton. | afagos e apertões em todas as bochechas.

Eu

gio disse...

e bruno critica gio como se ele nunca tivesse feito isso! ahahah

ailton | Homepage

gio disse...

isso é um bom assunto pra uma mesa na feirinha. mas, vejam bem: andrei tem razão quando diz q de certa forma estamos sós. basta levar em conta q sartre msm jah explicou isso em sua teoria existencialista; e essa solidão é angustiante, por si só (sem duplo sentido). Quando a kafka, dizem os críticos (e eu concordo) que não se tem como analisar sua obra sem analisar sua biografia. Isto é evidente. Quantos grandiosos literatos não insistiam em dizer q sua obra não era sua vida, e mesmo assim td mundo via na sua obra uma extensão de sua vida (byron, eça, pompéia - este inclusive se suicidou por isso)? // A morte é um lugar social, sim. E não dá pra analisar o lugar social de gregor sem levar em consideração o lugar social dos samsa, gio. Custódio, nosso ilustre prof, já dizia: contexto é o mais importante.

ailton | Homepage

gio disse...

Gregor sofria e sofreu da pior solidão que existe: a solidão acompanhada. E eu ainda não perdoei o safado do pai dele, velho sanguessuga, fingido..

Luís

gio disse...

pior que a solidão, sao os pais dele, até mesmo a Grete, todos com nojo de G. Samsa, maltratavam-no... que tristeza :( melhor livro de kafka (a quem sou suspeita, eheh) é o processo.. um baita livro!

Z

gio disse...

apertei enter sem querer. voltando... e o final deste livro, embora previsível, é surpreendente {contradição?}

se nao leu este livro, leia imediatamente ;]

Z

gio disse...

Ailton, como assim morreu sem motivo? Eu tenho dois motivos prováveis e um terceiro pertinente. Nº 1 Foi assassinado pelo pai, que arremessou uma maçã o ferindo gravemente. Nº 2 Morreu de velhice, afinal a longevidade dos insetos é curta. Também é pertinente acreditar que ele morreu de inanição causada por depressão, já que se sentia triste, impotente e sozinho.

Breno | Homepage

gio disse...

em alguns casos é nao só pertinente como indispensavel analisar a vida do cara pra compreender sua obra. mas eu disse em alguns casos! isso eh mais comum em poesia, mas um cara como lima barreto, por exemplo, nao tem como dissociar a vida dele do q ele escreveu. de kafka nao posso falar pq nao conheco nada. /// "juntar as solidoes" foi genial. e eu nao vou nem responder a essa, essa.. infâmia de ailton

bRUNO

gio disse...

Depois de ouvir Breno comentar do jornalista de uma matéria falando de O Processo, acho que fica de bom tamanho usar esse espaço para fazer um registro pertinente: Eu queria agradecer a Breno e a Ailton por anteciparem o final do livro que eu estava na metade. // Querendo, posso fazer um resumão de O Processo pra vocês.

Mythus | Homepage

gio disse...

seguinte, havia um lance entre kafka e seu pai. É tanto q ele escreveu "Carta ao Pai", que fica e em outras obras, como "O Veredicto", fica claro que ele se usava de sua prórpria biografia. Kafka é um daqueles q não dá pra analisar a obra sem levar em conta a biografia. Não acho que gregor morreu por um fato sólido; ele morreu porque quis morrer e só. É tanto q ele já estava praticamente curado da ferida da maça (Vê! Uma maçã! A fruta do pecado original. Embora kafka tenha um texto muito simples, ele não coloca esses significados à toa. Pesquisarei sobre essa semiótica da maçã!), e só tinha perdido parcialmente o movimento de uma perna, coisa assim. De fome é q ele não morreu, porque a empregada o alimentava. Ele morreu porque quis, povo! Percebam a sutileza: ele encontrou, enfim, o seu lugar social naquela família: a morte. no dia anterior, ele ouviu alguém comentar q era melhor q ele morresse, e aí ele morreu. pronto. foi assim.

ailton | Homepage

gio disse...

e a compaixao alheia. porque compreensao e pelo menos tolerancia ta longe, em outra galaxia longe daqui.

manu | Homepage

gio disse...

ERRATA: eu havia dito que kafka tinha pedido ao editor de A Metamorfose para não definir o inseto, mas ele na verdade pediu para que o editor não DESENHASSE o inseto, nem de longe. /// Breno, que história é essa de que a logevidade dos insetos é curta? Por acaso tu és um entomólogo amador, como eu o fui (cheguei até a colecionar coleópteros (vês, bruno? mais uma para minha biografia!) e passar noites em claro em busca desses bichinhos)?

ailton | Homepage

gio disse...

Para [b]Ailton[/b]: Não sou entomólogo amador, aliás detesto a maioria dos insetos. Mas sempre ouvi falar que o ciclo de vida desses animais era curto. Agora me tire esta dúvida: em "Ateuchus sacer", esse "ch" tem som de "q", né? E "sacer" lembra saciar. Começo a pensar que você inventou o nome desse inseto só pra nos sacanear! =P Um abraço!

Breno | Homepage

gio disse...

Tenho dados curiosos sobre Kafka. Vocês sabem quantos irmãos kafka teve? Quanto tempo passou até uma das suas tantas noivas vendesse seus escritos? Qual o nome da intermediaria que ele deu uns pegas e que levava as cartas a uma das suas paixões? Qual o primeiro prêmio que ele ganhou?

Helber

gio disse...

Não precisa ser nada amador pra saber que insetos vivem menos que homens. Alguém já viu uma praga de elefantes ou tartarugas? Só seres de circulo de vida curto podem ser pragas /// Blatella germanica: longevidade dos adultos: 4 meses (machos) e 6 meses (fêmeas) // Blatta orientalis: longevidade dos adultos: 60 a 250 dias // Periplaneta americana: longevidade dos adultos: 250-350 dias // Supella longipalpa: longevidade dos adultos: 115 dias (machos) e 90 dias (fêmeas) // Infelizmente não encontrei a longevidade do "Ateuchus sacer" só das baratas mesmo... Mas encontrei uns pdfs que talvez interesse a Ailton: http://www.ufrrj.br/institutos/ib/ento/tomo07.pdf e http://www.ufrrj.br/institutos/ib/ento/tomo08.pdf "Insetos do Brasil" Coleoptera 1ª e 2ª parte.

Mythus | Homepage

gio disse...

pessoas! muita calma nessa hora! era uma reflexão sobre a solidão. virou um debate acalorado sobre insetos! afe! mas então: Ailton - isso é sim um bom assunto pra mesa de bar na feirinha. não que eu goste de falar sobre insetos. mas o paradoxo vida x obra ta' na pauta. Lu - toda vez que eu falo em Gregor Samsa eu me lembra da tua raiva do pai dele :) | Z - eu não li O Processo não. mas tenho mais vontade de ler O Castelo do que esse ;) mas eu ja' te vi por aqui? | Brenim - concordo contigo. | Brunix - concordo contigo igualmente. e Ailton é a infâmia em pessoa. tu sabe. | Mythus - querer eu quero. mas não me conte o final. please. | Manu - verdade. mas não sei até que ponto a compaixão alheia pode ajudar a aplacar essa solidão. | Hélber - conte! conte! conte! | mais afagos.

Eu

gio disse...

breno, eu não disse q os insetos duram mais q os homens, mas sem dúvidas são mais organizados.

ailton | Homepage