terça-feira, 9 de maio de 2006

Porque né ? A pessoa foi ao cinema ver o filme oscarizado. Mas nem comentou aqui sabe lá porque. Aí a pessoa foi fazer comprinhas na Rua 25 de Março - vulgo Portal do Inferno - em Sampa, e avistou o dvd nas barraquinhas dos piratões e lembrou de como foi a experiência de ver o danado do filme e se emocionou.

Percebam a gravidade da situação: a pessoa se emocionou no centro de São Paulo. Como se não bastasse ter se emocionado no parque, em frente ao lago com os patos, e no sebo, em frente à estante com os livros infantis. Os limites todos do bom senso né? Foram para as cucuias de mãos dadas.

Tá. Vamos brincar de situar os leitores. Foi Brokeback Mountain. Quando eu soube do que se tratava o enredo, eu pensei com meus botões: "putz. sofrerei horrores." Eu me conheço bem, leitores amigos. Eu me conheço deveras bem desde longa data. E eu sabia. E foi batata. Eu sofri. Horrores.

Porque assim. Eu tenho isso. Ou issos. O primeiro isso é que eu sou capaz de me emocionar com os patos do lago do parque ou os livros infantis da estante do sebo ou os dvds piratas da barraquinha do camelô. O segundo isso é o negocio dos amores contrariados. Que têm sim cheiro de amêndoas amargas. Como quer Mestre Gabo. Que me seduz e me sufoca. E faz com que eu saia colecionando amores contrariados pela vida afora. Meus e alheios.

Não perguntem o porquê que eu não sei qual é. Só sei disso: eu sempre tive esse fascínio meio macabro por amores contrariados. A ponto de detonar as minhas próprias estórias de amor satisfeito pra me jogar de barriga nas estórias de amor fadadas ao fracasso, ao sofrimento e à dor.

Eu nunca prometi não ser enferma.

Então é isso. Entendem?

Eu sou Jack Twist que sofre porque não pode ter Ennis Del Mar porque ele tem medo de enfrentar o mundo. Eu sou Florentino Ariza que sofre porque não pode ter Fermina Daza porque ela escolheu Juvenal Urbino e não ele. Eu sou Otto que sofre porque não pode ter Anna porque a vida separou os dois tantas vezes que eles, mesmo querendo, não conseguem mais se encontrar. Eu sou Cayetano Delaura que sofre porque não pode ter Sierva María de Todos los Ángeles porque ele é um padre exorcista e ela é uma criança endemoniada. Eu sou Chow Mo-Wan que sofre porque não pode ter Su Li-Zhen Chan porque os dois são casados e é melhor que tudo continue assim. Eu sou Peter Walsh que sofre porque não pode ter Clarissa Dalloway porque ela é uma moça rica que deve fazer um bom casamento. Eu sou Olivier que sofre porque não pode ter Julie porque era o melhor amigo do marido dela e ele morreu e o fantasma dele assombra demais os dois. Eu sou André que sofre porque não pode ter Ana porque eles são irmãos.

Entendem?

Eu sou todos e cada um deles. E não há como não sangrar quando uma estória de amor assim me pega pelo pé. Porque eu preciso ver o sangue pra ter certeza de que ele corre sim nas minhas veias.

Mas eu nunca prometi não ser enferma.